sexta-feira, outubro 25, 2013

Às vezes chego ao fim da noite com palavras, ainda por dizer, dentro do peito. Não as libertei todas. Elas, que são borboletas à procura da liberdade do mundo por fora de mim. Ou do céu em branco de uma folha de papel. Elas, dizia, esvoaçam por dentro de mim. Querem sair. Querem nascer. Querem ferir o espaço vazio e ecoar contra as montanhas dos dias. Eu, por vezes, estou cansado. Ou semi-quebrado. Ou qualquer coisa em mim tem vontade de se desligar. Nessas alturas, é difícil dar-lhes atenção. Tento acalmá-las. Vender-lhes a ilusão de que amanhã é um dia óptimo para nascer. Mas elas, regra geral, não esperam. São irredutíveis. São incansáveis. Lutam contra mim até eu as deixar existir no limiar da noite. Acabo por ceder. Tarde ou cedo, cedo sempre. E fico aqui. Sentado. Quase imóvel. A assistir à dança noctívaga dos dedos. Enquanto elas nascem. Vivas e palpitantes. Meias atarantadas. E desenham no céu de Outubro silhuetas luminosas. Contornos dourados na escuridão. Centelhas de luz na noite que, agora, se deixa adormecer.